NECESSIDADE INADIÁVEL – SER LIVRE
Não me sentia preparado para tal. Ainda não me sinto. Precisava mais tempo, mais aprendizagem. Mas por vezes as coisas são assim. O momento impõe-se à nossa agenda e limitações. E o compromisso que assumimos, a palavra que damos, quando entramos em projectos audaciosos implica que às vezes o nosso tempo tenha de ser abreviado.
Foi assim que vi o meu prazo encurtado e me deparei perante a “obrigação” de ser candidato à direcção de um partido político. Com efeito, perante a demissão do Grupo de Contacto do LIVRE, o calendário andou para a frente alguns meses, antecipando o Congresso Electivo que deveria ter lugar no primeiro trimestre de 2016. Quanto a esta demissão falei na devida altura com inúmeros membros do órgão e transmiti-lhes o que pensava. Acima de tudo interessa referir que respeito a decisão tomada, apesar de nos ter colocado numa situação de stress político, quando de repente nos vimos na eminência de eleger novos órgãos até ao final do ano. Mais uma vez demonstrámos ser capazes de realizar impossíveis em períodos de tempo impraticáveis, o que diz muito da nossa natureza.
Falo em “obrigação” pois embora entre os membros e apoiantes, e muitos companheiros da caminhada Tempo de Avançar e independentes, se percebesse que a intenção era de continuar, a realidade é que se demonstrou difícil chegar a um grupo de pessoas com disponibilidade e empenho suficientes para formar uma lista candidata ao Grupo de Contacto. Desta dificuldade surge a necessidade inadiável de formar um grupo representativo da diversidade do LIVRE e que construisse uma moção em contra-relógio, sobre a qual pudéssemos edificar o futuro do LIVRE. E não vale a pena camuflar esta situação, até porque só enaltece o esforço que se colocou nesta concretização.
Confesso que ainda ontem durante o dia me debatia com dúvidas se seria mesmo este o passo correcto. Por isso não quis falar. Quis observar e sentir o pulsar do congresso. À entrada observava as faces dos camaradas que chegavam. As expressões eram múltiplas por certo. Mas todas elas demonstravam convicção. Aquelas cerca de cem pessoas, que ontem se reuniram no Conservatório de Música de Lisboa, tinham a certeza que num frio domingo de Dezembro tão perto do Natal só poderiam estar ali. A debater as razões, a decidir o presente, a desenhar a esperança.
Se alguém tivesse dúvidas que o LIVRE é um projecto político que terá, mais tarde ou mais cedo, uma expressão prática dos seus princípios, ontem foram dissipadas. A qualidade das intervenções demonstrou isso mesmo. A assertividade na crítica e nos caminhos apontados. E a afirmação de que é possível fazer mais e melhor. Que a nossa sociedade merece outro tratamento e que a cidadania é capaz de muito mais do que aquilo que lhe é permitido. O espaço do LIVRE é o espaço progressista, onde se esboça um novo modelo de desenvolvimento, sustentável e sustentado, e onde se estimula a iniciativa cidadã, fomentando a sua participação efectiva. Somos um partido do século XXI e como tal temos plena noção que, embora os partidos façam falta à democracia, a mesma não se esgota nestes. Uma democracia moderna, que deseje uma sociedade mais justa e lute por atenuar as desigualdades, terá de entrecruzar na política múltiplas dimensões. Dos partidos às associações; dos sindicatos ao ensino superior; das colectividades aos movimentos cívicos.
Para que um partido esteja à altura deste desafio da nova política tem de se destacar do patamar da mediocridade. A possibilidade do LIVRE elevar a fasquia resulta da massa crítica que possui, da qualidade que circula pelos corredores do partido. Todos temos noção que existe muita vontade entre os membros e apoiantes, mas o conhecimento que transportam é fulcral para que a vontade se traduza numa melhoria efectiva e numa alternativa real ao modo como estamos organizados e como interagimos enquanto sociedade. O LIVRE é um partido ambicioso nas metas que traça, fruto da exigência que tem para consigo mesmo. As questões são discutidas intensamente por quem percebe do assunto e para os problemas surgem sempre soluções exequíveis e realistas.
É com esse espírito que parto para o mandato de 2 anos que enfrentamos. Temos de comunicar melhor e alargar as bases. A organização precisa de funcionar e, nos casos que se justifique, ser aperfeiçoada. Durante a vigência do mandato enfrentaremos duas provas de fogo: as eleições regionais nos Açores e as eleições autárquicas. Mas essas merecem uma reflexão mais cuidada, que não deve ser abreviada no presente texto.
As dúvidas que me assolavam, e que referi no início, ontem dissiparam-se. As escuras nuvens que se avizinhavam no horizonte deram lugar ao Sol. Não esplendoroso e radiante; antes tímido e que serve de ligeiro conforto ao Inverno que passamos. Mas é um começo, um raio de esperança. E a certeza que dali nascerá algo muito maior que a soma das nossas vontades. Alicerçado nos nossos pilares e na qualidade dos documentos que produzimos até agora. Colocando o nosso pensar e conhecimento ao serviço do bem comum. Porque nos recusamos a contentar com um mal menor.
Espero sinceramente estar à altura do desafio. E que das minhas fraquezas e impreparação faça forças para travar as lutas que se avizinham. Só poderá ser assim, não conheço outra forma. Não conhecemos outra forma. Se falharmos, não será por inacção. Ousámos ser LIVRE e isso nunca ninguém nos poderá retirar. Agora, não me resta dizer muito mais... Arregacemos as mangas e façamos política.
Montijo, 21 de Dezembro de 2015